domingo, 28 de agosto de 2011

Deus e o Diabo na mente de Glauber Rocha

Na morte de Glauber Rocha, em 1981, Darcy Ribeiro contou: Uma vez, que eu não vou esquecer nunca, Glauber passou uma manhã abraçado comigo, chorando, chorando, chorando compulsivamente. Eu custei a entender, ninguém entendia, que Glauber chorava a dor que todos nós deveríamos chorar, a dor de todos os brasileiros. O Glauber chorava as crianças com fome. O Glauber chorava este país que não deu certo. O Glauber chorava a brutalidade. O Glauber chorava a estupidez, a mediocridade, a tortura. Ele não suportava. Chorava, chorava, chorava. Os filmes do Glauber são isso. Um lamento, um grito, um berro. É a herança que fica de Glauber. Fica de Glauber para nós a herança de sua indignação. Ele foi o mais indignado de nós.
Dizem também que nunca houve para o cinema brasileiro um casamento mais interessante do que o de Glauber Rocha e Helena Ignez que era atriz e atuou por exemplo no filme "A mulher de todos", sendo muito referencial para o cinema marginal. Glauber se casou também com Martha Jardim Gomes e com Paula Gaitán. Glauber agia entre a esperança e o desespero.

"Se eu quisesse ganhar dinheiro, eu ia ser empresário ou me dedicaria inteiramente à indústria de comunicação", dizia. "Mas eu não quero ter as doenças da burguesia: senilidade sexual e câncer." E dizia também: "É incrível como ninguém me descobriu para a política". Mas sim, mais do que ele imaginava seu papel era importante para política, não só por filmes como o Terra em Transe, mas por sua postura pouco compreendida inclusive pela esquerda brasileira.
Além de ser a grande figura do cinema novo, alguém que queria denunciar o absurdo de tudo, ele simplesmente pensava um novo Brasil no estilo "uma câmera na mão e uma idéia na cabeça", e além de ter dado uma identidade nova ao cinema brasileiro,ajudou a formar uma nova ideologia para a inteligencia Brasileira. "O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro" que foi para o Festival de Cannes em 1969, ganhou o prêmio de melhor diretor. Depois, com o crescimento da repressão Glauber escolheu se exilar.
Mais tarde foi ridicularizado pela imprensa brasileira que noticiou que ele foi visto caminhando na praia de Ipanema, enrolado num cobertor como mendigo, falando sozinho e também foi visto conversando com as paredes do hotel, em Santiago do Chile, com um microfone na mão dizendo: “Aqui é Glauber Rocha, eu sei que a Cia está gravando, e a KGB também”. Glauber passou algum tempo em Portugal antes de morrer, aos 42 anos de idade. As causas da morte nunca foram esclarecidas. Pouco antes de partir seus filmes foram exibidos em mostras retrospectivas de países como, Inglaterra , Estados Unidos e França. Recentemente, o senado pela ocasião dos 30 anos de sua ausencia relatou: Quando se via ou se ouvia Glauber, tinha-se a impressão de um permanente vulcão intelectual, em atividade ininterrupta de negações e afirmações. A racionalidade lhe despontava em pequenos clarões, lampejos até desnecessários, porque tudo era uma busca incessante da causa das causas, indagação contínua e angústia intelectual que marcaram sua trajetória. Glauber dizia que não podia se connsiderar um cineasta profissional, porque assim teria que atuar segundo a indústria cinematográfica. Mas ele preferia se considerar um amador, como o Buñuel, alguém que ama o cinema”. Dizia também: “Prefiro ser um cadáver a um desses mortos-vivos que andam por aí”. Engraçado que Glauber foi educado como protestante na igreja presbiteriana, religião da mãe, por ação de missionários americanos da Missão Brasil Central e mesmo assim era em essencia um artista, poeta e diretor incontestavelmente brasileiro. Não se sabe se era o mais lúcido ou o mais louco de todos. Mas, conta-se (e foi Zuenir Ventura quem relatou) que houve um jantar na casa de Maria Clara Mariani, filha do banqueiro Clemente Mariani, em homenagem a Violeta Arraes, irmã do ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes. Glauber não compareceu. Estavam lá Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gustavo Dahl, Hélio Pellegrino, Arnaldo Jabor. Ao final da conversa eles chegaram a um acordo: se existia algum gênio no Brasil, ele era Glauber Rocha. "Ele é maior que Villa-Lobos, maior que Portinari, só comparável ao Aleijadinho", foi o que disse Dahl que também foi um cineasta e crítico do cinema brasileiro.
O que Glauber fazia era (seriamente) política.

Alaise Beserra

alaise30@hotmail.com

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